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Um vídeo que deve ser visto em conjunto com o seguinte texto
João Rodrigues em Ladrões de Bicicletas
(Foto: jn.pt)
Miguel Relvas corre o risco de perder a licenciatura não por causa de cadeiras sobre as quais se desconfia que pouco deve saber, mas por causa de uma cadeira cujos conteúdos demonstrou conhecer e à qual foi avaliado.
Perfeitamente de acordo com a possibilidade de que a experiência e conhecimentos adquiridos ao longo da vida sejam academicamente validados e contribuam para obtenção de grau.
Mas convém que os conhecimentos adquiridos tenham correspondência com a realidade. Não servem para tudo. Se nunca operei um cérebro, não vejo muito bem como me darão equivalência a neurocirurgia.
Num outro nível, a exigir menor especialização técnica, como o da licenciatura em Ciências Políticas e Relações Internacionais, na Universidade Lusófona, Miguel Relvas obteve equivalências a 32 das 36 disciplinas que constituíam o curso, à conta da sua experiência profissional.
Alguém que, como Miguel Relvas, andou toda a vida profissional muito próximo da gestão da coisa pública e exerceu cargos governamentais estará obviamente bem preparado para obter um número relativamente alto de equivalências num curso do género do escolhido. Miguel Relvas terá obrigatoriamente uma percepção muito acima da média sobre o que é a administração pública e a sua prática.
Mas, por mais competente e capaz que fosse, há sempre uma carga alta de conhecimentos teóricos de base, do campo da filosofia, da história e da ciência política que não terá adquirido. Por algum motivo lhe pediram que realizasse provas em cadeiras como Quadros Institucionais da Vida Económica Política e Administrativa; Introdução ao Pensamento Contemporâneo; Teoria do Estado da Democracia e da Revolução; e Geoestratégia, Geopolítica e Relações Internacionais.
O que é estranho é que num curso que necessariamente terá muitas cadeiras deste género, Miguel Relvas tenha obtido 32 equivalências à custa da experiência profissional. Que conhecimentos demonstráveis de história ou de filosofia terá podido apresentar através do currículo profissional?
Infelizmente, não é isso que o trama - ou pode tramar. O que trama Miguel Relvas não é a sempre discutível atribuição de créditos em cadeiras sobre cujos conteúdos dificilmente terá conhecimentos, mas cuja validade foi reconhecida pelos catedráticos da área.
O que o trama é uma regra interna, perfeitamente burocrática, que o impede de fazer avaliação com base apenas numa oral. O ex-ministro corre o risco de perder a licenciatura por causa de uma cadeira a que foi realmente avaliado e ninguém pode dizer que uma oral é menos exigente que um exame escrito. Num exame escrito, e ainda mais num curso da área das humanidades, o avaliado pode sempre refugiar-se naquilo que sabe melhor, evitando o que ignora e camuflando fragilidades. Em oral, corre o risco de que lhe descubram todos os vícios.
É fácil transformar uma notícia em opinião. Veja-se o lead de peça apresentada ontem na SIC.
"Depois das consequências para a economia dos longos períodos de greve em 2012, as atenções voltam-se de novo para a zona portuária. O sindicato dos estivadores denuncia..."
No primeiro período apresenta-se o que se considera "O Facto": Greve longa teve consequências na economia. Não há fonte para a questão do impacto económico. É puro senso-comum apresentado como axioma. Tal como é factual e absoluto o ter também resultado da greve.
Logo a seguir, diz-se que o "sindicato dos estivadores denuncia..." Aqui já se admite um ponto de vista, que mais à frente será contraditado, como mandam as regras, pelo ponto de vista dos seus empregadores. O que ocorre nos portos é atribuído. Já não é senso-comum. Há uns que dizem umas coisas, outros que dizem outra. O que sucede nos portos, é um puro caso de luta de interesses e direitos. Um combate de relativos.
O que é dado em termos absolutos, factuais, exactos é a ideia de que a greve, feita pelos estivadores, tem impacto na economia. Claro que terá, mas o efeito desse impacto é tão construído como os pontos de vista de estivadores e empregadores. Mas o jornalista dá-o como adquirido, como legítimo. Não o dá como tendo origem num gabinete de assessores ministeriais com interesse em denegrir a imagem dos estivadores em greve. É o jornalismo a tomar partido em vez de informar.
Quando se fala cada vez mais da necessidade de crescimento económico, uma greve com impacto na economia afasta a compreensão dos espectadores mais dispostos a culpar os rotos pela sua miséria. E são tantos.
O que não falta por aí são peças com a conclusão pronto-a-vestir logo à cabeça, notícias prontas a disparar sobre os grevistas, opinião com gato escondido. Eu fiz engenharia. Não estudei os sentidos que encerram as frases, a insustentável leveza de um testemunho, de um ponto de vista. Não me ensinaram os abismos onde caem os factos em estado puro. Mas a maior parte dos jornalistas fez ciências da comunicação, cursos onde se estudam estas coisas. É impossível não saberem o que estão a fazer.
Luís Rainha, no jornal i
Viriato Soromenho Marques, no Diário de Notícias
(Foto: em Guardian.co.uk)
Dificuldades de actualização levaram a que não se assinalasse no dia 20 a morte do protagonista d'Os Sopranos, série charneira no cenário das séries televisivas.
O pessoal que no comentário jornalístico e na blogosfera protestou contra os professores de greve em dia de exame encontrou durante a semana aliados preciosos.
Num dia, um grupo de deputados da JSD, colectivo onde o bom-senso marca escassa presença, exigiu saber quanto custam os sindicatos ao Estado. Ou seja, embora não percebam o alcance da ideia, desagradam-lhes os custos da democracia.
No dia seguinte, foi o sempre poupado Alberto João Jardim que reclamou a mudança da lei da greve.
Benditas companhias.
No aniversário de Chico Buarque.
Soube-se ontem que o primeiro-ministro convocou um conselho de ministros extraordinário para este sábado.
Segundo a comunicação social, os titulares das pastas receberam indicações de Passos Coelho para apresentarem medidas que visem o cumprimento da segunda parte da legislatura.
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