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(Fonte: aecentroncamento.pt)
Os exames escolares enquanto prova e equivalente inatacável da exigência de aprendizagem instalaram-se aparentemente inamovíveis no discurso público. Um natural e alegado senso comum trabalha irresponsável nas mentes de um País que a quatro anos do 25 de Abril ainda tinha trinta por cento de analfabetos. Ou seja, uma grande percentagem das avós dos que hoje nos governam saberiam, quando muito, escrever o nome e ler ‘tá quieto. É este povo que vê num exame, e no cumprimento rigoroso de uma data, um nariz de santo intocável e todo poderoso cuja violação acarretará vício, morte e destruição.
Mas faz-se por isso. No dia em que regressaram os exames à antiga quarta classe, Maio deste ano, um director do principal diário de referência nacional recordou o dia em que ele próprio fora examinado numa cidadezinha de província rescendendo a Estado Novo e a estudantes alsacianos.
O resultado foi uma prosa saudosista, de ideias tão luminosas como as de um velho manual da 3ª classe. Nem sequer deixou de fora os memoráveis castigos aos que “eram burros”, castigos a que - pela amostra - não pode ter escapado o meu camarada jornalista. Naquela cabeça com galões e emprego não entrou o que significava para a maioria dos colegas a 4ª classe daquele tempo.
Trágico que enquanto faz memorialismo banal, Manuel Carvalho caucione e legitime as ideias do ministro da Educação - um pensamento que pouco evoluiu desde os dias em que defendia o mais violento maoísmo no Pedro Nunes, o privilegiado liceu da Estrela, da Lapa, São Bento, Campo de Ourique. Já então Nuno Crato fazia pela destruição da escola. É pedir a professores da época que contem os ditos e feitos do agora governante.
Aos exames em todos os níveis de ensino – chancela de exigência cratista - contrapõem-se turmas de 30 alunos; horários dos professores alargados para as 40 horas em escola, que é para não haver tempo nem condições para preparar as aulas e um bom incentivo a que muitos docentes passem a ditar os manuais escolares aos estudantes; instabilidade de vínculo, espevitando a pouca vontade de investir na qualidade do que fazem.
À perda de qualidade real do ensino, parecem os jornais pouco atentos. Mas não são os únicos. Com a greve como horizonte, levanta-se o habitual coro de protestos contra as datas escolhidas pelos sindicatos dos professores, em cima da época de exames. Em Portugal, há sempre um ror de gente a favor da greve desde que não se prejudique os outros. No fundo, “Come, cala-te e não chateies”. Só não a proíbem, porque a Constituição ainda não deixa, mas já se ouviram vozes nesse sentido. É o pessoal danado porque não tem transportes, é o pessoal zangado com os professores que vão adiar o momento em que os seus filhos serão avaliados.
Os mesmos que aplaudem a ansiedade e a imposição de um educativamente inútil obstáculo exame aos estudantes de todos os níveis de ensino rugem furiosos com a instabilidade provocada por um adiamento da prova. Como se a prova não pudesse ser feita depois, como se a contestação não pudesse forçar ao recuo da sua aplicação ou ponderação. Em regime de igualdade para todos.
Entre os pais, muitos nem sequer percebem que há coisas bem mais graves para o futuro dos filhos do que fazer o exame noutra chamada (até ganham tempo, sem aulas, para estudarem e se prepararem melhor). Exigem respeito pelos filhos, pelos direitos dos pimpolhos, mas esquecem-se que o que realmente lhes vai tramar a prole é o aumento do número de estudantes em cada turma; a transformação de milhares de professores em andarilhos, desenraizados perpétuos à beira do desemprego; o impedir os professores de prepararem aulas impondo-lhes uma carga horária populista e demagógica. A turba aplaude. É a destruição do sistema público de ensino que o ministro vai levando a cabo, mas que interessa isso se há exames?
Outra jornalista, e directora, por quem até tenho estima pessoal, afirmava há dias na televisão, convencida de que achara o mais colombiano dos ovos de Colombo argumentativos, que “se as datas dos exames podem ser mudadas, como afirmam os sindicatos, então também se podem mudar as datas da greve”. Claro. Agosto é que seria uma boa altura que não maçava ninguém e Governo, pais, estudantes e professores aproveitariam os areais para discutir o que está em jogo.
Ao lado do Governo, Cavaco avisa os professores que os estudantes ”não podem ser um meio para atingir um fim” e recorda que “a greve é um direito”, modo como começa sempre a conversa dos que se manifestam contra o seu exercício. Mas Cavaco é capaz da compaixão. Até manifesta a sua “dificuldade em compreender bem como é que se podem atingir jovens, crianças, jovens que estão a preparar o seu futuro”. Não mostra é qualquer empatia com os professores que tentam defender um presente bastante negro e muitos deles também pais, educadores e sustentáculo de jovens e de crianças, mas de jovens e de crianças que pelos vistos não preocupam tanto o inquilino de Belém.
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