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Depois de dez anos daquilo, em Belém, ainda há "na direcção socialista quem sublinhe ao PÚBLICO que o PS pode passar bem sem apoiar nenhum candidato e até ver eleger um Presidente que não seja de esquerda."
Não perceberam nada. E nem vão perceber.
Na altura em que se publicou isto, iam-se os jornais enchendo dos habituais defensores dos consensos que nos trouxeram à presente tragédia económica elogiando as palavras do defesa direito de Passos Coelho e Paulo Portas em Belém.
No dia a seguir, 70 agentes políticos, económicos e sociais lançaram um manifesto defendendo a reestruturação da dívida, em manifesto contrapelo com a opinião cavaco-governamental da véspera.
Cavaco, é mais que público, manteve até ao limite do insuportável Dias Loureiro, no Conselho de Estado, e trocou-o pelo o sempre opinoso, amoral e cínico Vítor Bento. Mandou recolher Fernando Lima aos aposentos e para longe dos olhos depois de este andar com José Manuel Fernandes dando corda à inventona das escutas. E podia continuar-se.
Agora, dois assessores presidenciais atreveram-se a subscrever o manifesto dos 70. Já tiveram guia-de-marcha para fora do palácio de Belém.
Cavaco vinca bem em que alhada nos quer a todos metidos.
O tempo das contemporizações acabou. São cúmplices do saque e do apodrecimento desta Feira Cabisbaixa - ainda agora citada no encontro em defesa da constuição que anteontem ocorreu em Lisboa - todos que nos últimos dois anos não perceberam o que está em causa na Europa e em Portugal. Todos que não pararam de se queixar de protestos, greves, confrontos, aceitando boa ou pacientemente o mais que lhes têm servido.
Com a opinião pública terraplanada pelo boicote das estações televisivas, pelos oficiais do espectáculo mediático, pelos jornais que dizem que a lei diz o que não diz, com o tiro de partida dado por Passos Coelho, a nas últimas semanas tão pedida alteração da lei da cobertura jornalística eleitoral conta, desde ontem, com o alto patrocínio do inadjectivável Cavaco.
Mas, afinal, o que diz a lei?
No Artigo 49º - Comunicação Social – alínea 1 refere que “[o]s órgãos de comunicação social que façam a cobertura da campanha eleitoral devem dar um tratamento jornalístico não discriminatório às diversas candidaturas”
Suscita dúvidas? A mim não suscitou. Como a lei é de 2001 e já foi aplicada nas eleições locais de 2005 e de 2009, em princípio não deveria implicar divergências interpretativas. Mas um grupo poderoso de jornalistas resolveu opor-se a esta lei que garante o pluralismo.
Directores de informação alegam terem surgido interpretações "posições mais restritivas" e que “não é humana e tecnicamente possível” dar o mesmo destaque a todas as candidaturas.
Mas que disse realmente e desta vez o presidente da CNE sobre o artigo em causa?
Que interesses servem estes jornalistas? O da informação não é de certeza. E quer Cavaco, quer Passos Coelho, com as responsabilidades que lhes advêm dos cargos Executivos que ocupam, já colheram a, em nada democrática, vontade de alteração da lei da cobertura eleitoral que directores dos canais televisivos e de algumas rádios semearam.
O inquilino de Belém corre sistematicamente atrás do prejuízo. Não por se encontrar acometido por qualquer bambúrrio de azar, olho gordo ou obsessão persecutória de adversários mesquinhos – como acreditará intuir –, mas por manifesta inadequação pessoal e política para o cargo que ocupa e para o qual o elegeram duas vezes.
Escolhas tanto mais grave quando na última delas já se sabia da inventona das escutas de Belém e dos lucros com acções saídas do aparato criminoso-financeiro que atirou o país ao buraco e que faziam com que só os muitíssimo distraídos comprassem Cavaco por Presidente. À segunda, cai quem quer.
No seu critério, Cavaco pode muito bem ter entendido apresentar, de modo discreto, as condolências às famílias e corporações dos bombeiros mortos este ano no combate aos fogos florestais. Mas por força das circunstâncias, estas mortes colaram-se à morte de António Borges.
E, sem acesso ao poder, António Nuno Ferreira, Pedro Rodrigues, Ana Rita Pereira e Bernardo Figueiredo são heróis que deram a vida pelo bem comum.
Já António Borges era um amigo de Cavaco, muito bem pago, de currículo polémico, tornado conhecido por declarações da mais manifesta insensibilidade social e que usou sempre o muito poder e influência que tinha para dar mais dinheiro a ganhar aos habituais grupos económicos e financeiros. Os seus préstimos para a sociedade e para o país foram para um grande número de portugueses duvidosos ou mesmo prejudiciais.
Há alturas em que a falta de consistência política e a duplicidade de critérios fazem um ruído aterrador.
Em condições de regular funcionamento das instituições, a óbvia resposta negativa do PS à proposta de Cavaco para uma solução de Salvação Nacional levaria à queda do Governo. Cavaco arrisca-se a fazer cair o Executivo dando a sensação de que nada teve a ver com a coisa.
Alguns Miguéis Sousa Tavares são mais Carlos Costais que outros.
Os dias que devia usar para tentar salvar o país, gasta-os Cavaco a tentar salvar-se a si próprio.
Depois de, há umas semanas, ter parecido assumir algumas responsabilidades por erros cometidos enquanto primeiro-ministro nos sectores da agricultura e da pesca, meteu marcha à ré e fez mea culpa do mea culpa.
O País já não lhe diz nada. O discurso de Cavaco já só tem um destinatário: o próprio Cavaco esbracejante, tentando salvar-se para a História, para a eternidade.
(Foto: Steven Governo/Global Imagens in jn.pt)
Em tempos de crise tão séria que até afecta a sempre poupada instituição presidencial, será clarificador que alguns conselheiros de Estado expliquem a Cavaco o inusitado da agenda da reunião de hoje - Portugal depois da saída da tróica.
As críticas não faltarão. Mas, pelo teor das suas declarações nas últimas semanas, Cavaco não andará disposto a ouvir análises que falem da austeridade ou da existência real de uma crise política há muito em curso.
Da última vez que se reuniu este órgão de aconselhamento presidencial, Mário Soares saiu consideravelmente antes do fim. Desta vez duvida-se que haja saídas extemporâneas.
Olhando para a composição do órgão, Seguro não o pode fazer. Arrisca-se a ter de lidar com Cavaco enquanto Presidente. Os presidentes dos tribunais, dos governos regionais e o provedor de justiça estão lá enquanto representantes institucionais.
Dos que se representam a si próprios, Sampaio tem uma visão formal, respeitadora e litúrgica do exercício da coisa pública. O mesmo se passa com Eanes. O general, acresce, não andará longe do ponto de vista de Cavaco. Eventualmente do do Governo. Os restantes conselheiros estão alinhados com a maioria ou com Belém.
Apenas o antigo Presidente Mário Soares e Manuel Alegre terão a vocação e a liberdade de pensamento suficientes para perturbarem o sossego do Conselho de Estado, juntando palavras críticas a uma saída abrupta da reunião.
Fazer previsões sobre o estado do país daqui a um ano tem demasiado de futurologia para justificar o tema da convocatória para hoje. Se as certezas e dúvidas do Presidente não forem confrontadas fora do seu quadro mental, este Conselho de Estado não servirá mesmo para nada.
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