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No discurso de aceitação do prémio Camões, o escritor Raduan Nassar criticou o governo de Michel Temer e o Supremo Tribunal Federal brasileiro.
E, a seguir, Roberto Freire, ministro da Cultura de Temer, disse ao escritor que "quem dá prémio a um adversário político não é a ditadura" e acrescentou também que quem dá o prémio é o Governo brasileiro. O governante percebe mal o que caracteriza uma democracia e pelo caminho ainda provoca um conflito diplomático. Freire esqueceu-se de modo deselegante da contraparte portuguesa, que é tida e achada nesta questão. Atribuído pela primeira vez a Miguel Torga, em 1989, o prémio é subsidiado não apenas pelo governo brasileiro, mas também pelo português. Foi criado em conjunto pelos dois países. E é atribuído por causa da língua comum e não por qualquer poder político de turno. É o mais importante prémio literário da língua portuguesa, mas Freire vê-o como instrumental. O ministro da Cultura brasileiro sugere mesmo que se Nassar não gosta do Governo devia recusar o prémio.
Este tipo de pensamento não é original. Já há um par de anos, na entrega do Grande Prémio do Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, Jorge Barreto Xavier, secretário de Estado da Cultura do Governo de Passos Coelho e de Paulo Portas, disse à premiada, Alexandra Lucas Coelho, que ela devia estar grata por viver em democracia o que lhe permitia ter feito um discurso de aceitação do prémio onde batia no Governo e em Cavaco. Xavier terá acrescentado ainda que se a autora estava a receber os quinze mil euros do prémio isso também se devia ao Governo que o subsidiava.
Nos dois governantes, uma mesma crença. A de que a língua lhes pertence a eles. É também um querer castrar a voz do outro. Uma voz permitida se fizer parte de um ritual. E uma voz não tolerada se se quiser tornar acção.
O El Pais contabiliza as línguas do Nobel da Literatura. Vinte e sete autores de língua inglesa, 14 da francesa, 13 da alemã e 11 da espanhola. Os 11 premiados em espanhol (espanhóis mesmo espanhóis apenas cinco: Echegaray, Benavente, Jiménez, Aleixandre e Cela) são ultrapassado pelos premiados em francês e alemão, duas línguas com menor peso de falantes. Também há seis premiados que escreveram em russo - tantos quanto os vencedores italianos e menos um que os suecos, que, de qualquer modo, jogam em casa.
Mas o que o periódico quer vincar é o desequilíbrio a favor dos idiomas ocidentais, contra línguas tão faladas como o chinês (Gao Xingjian e Mo Yan), o japonês (Yasunari Kawabata e Kenzaburo Oe), o árabe (Naguib Mahfouz), o bengali (Rabindranath Tagore, já em 1913). Este enviesamento tem razões históricas.
Até por isso, mais notório se torna o muito residual peso do português entre os vencedores do galardão. Num prémio que tem sido tão ocidentalizado, um país ocidental, detentor de uma das seis línguas mais faladas do mundo (por causa do Brasil), com uma literatura cultivada desde o século XIII, consegue ter apenas um vencedor - José Saramago, em 1998.
A coisa passou à frente de vários olhos jornalísticos. Dos autores da adaptação da peça nos lugares que a publicaram, aos editores e chefias que terão aprovado a sua publicação.
A ninguém ocorreu que uma prática de medicina tradicional (até vem lá escrito na notícia), conhecida também em Portugal (e divulgada com um nome que será contemporâneo - e não milenar, como a prática) não pode ser conhecida pelo nome sem tradução atribuído por um canal de televisão norte-americano.
Falta-lhes noção de contexto e de cultura.
(Foto: rr.sapo.pt)
Durante demasiados anos, o Comité Olímpico Português teve Vicente Moura como dirigente máximo - um trabalho temperado com rasgos de autoritarismo, gaffes e falta de respeito por atletas.
Os resultados nunca saíram da banalidade e as episódicas medalhas deveram-se bem mais a rasgos individuais do que a um trabalho de continuidade.
Substituído o comandante, já se confirmou que voltamos a andar mal servidos de dirigente.
José Manuel Constantino anunciou há dias que Miguel Relvas será Alto Comissário da Casa Olímpica Portuguesa no Brasil.
Ou o presidente do Comité Olímpico Português chegou ontem de Marte ou tem uma exigência muito baixa em relação ao perfil ético e de cidadania dos que escolhe para consigo colaborar.
Só uma das duas justifica que ache que o ex-ministro, tendo passado pelo Governo como passou, tenha condições para assumir seja qual for o cargo público ou de representação nacional.
As lista são sempre pessoais. Dos Dez Melhores... , dos Dez Piores... , das Dez Mais Bonitas... , dos Dez Mais Cobiçados... , etc..
Dirão mais sobre quem as elabora que sobre a qualidade concreta do que propõem.
Agora que entregaram o Camões ao enviado de Dalton Trevisan, no Brasil a lista dos candidatos mais imediatos tem pelo menos dois nomes. Um é óbvio, o dramaturgo Ariano Suassuna, autor do picaresco O Auto da Compadecida. O outro também é óbvio. Chama-se Chico Buarque, estudou arquitectura e escreveu poemas com o rigor de uma Construção.
(Foto: ecoespacio.es)
Os liberais-soberanistas catalães encheram-se de contribuir para o orçamento do Reino e resolveram pedir eleições, a ver se referendavam a independência.
Tramaram-se e perderam 12 deputados. Terá havido muitos outros motivos, mas talvez alguns eleitores tenham percebido que o mercado consumidor castelhano e das restantes autonomias não é de deitar fora se a Catalunha quiser continuar como um dos motores económico na Península. A ver o que dá entretanto o novo equilíbrio de forças com a subida da Esquerda Republicana.
No Brasil, esperam-se manifestações exigindo a Dilma Rousseff que vete o aumento da percentagem dos lucros do petróleo a redistribuir pelos estados não produtores. Seja em que país for, é sempre um gosto, ver os egoísmos regionais e locais sobreporem-se aos interesses do colectivo.
Por cá, para o Público, apanhou-se o comissário europeu do Emprego, Assuntos Socias e da Inclusão numa conferência na Gulbenkian. László Andor, confessou a sua estupefacção com os níveis de desemprego a que a Europa chegou, insistiu em boa parte da receita e admitiu o aparecimento de uma geração perdida nos países do Sul. Não foi por falta de avisos que houve-os suficientes, mas há dificuldades de compreensão que a compreensão não compreende.
Em Espanha, o El País ouviu Dilma Roussef, participante na conferência Ibero-Americana, e a presidente brasileira lembrou o papel do FMI na década de 1980 na América do Sul e o impacto profundamente negativo que teve no emprego e nas vidas daquele continente.
É o mesmo o FMI que descobriu que Portugal se arrisca a perder a sua geração mais qualificada de sempre, condenada à emigração ou ao sub-emprego e deitando fora o investimento que o País fez nela. Valia a pena ter mandado jornalistas a Cádiz, onde se realizou a cimeira Ibero-Americana ouvir uma líder com estatura internacional dizer o que há para dizer.
(Foto: dn.pt)
Ao menos por lá, mesmo que isso arrelie os durões barrosos de serviço, há resultados e indicadores económicos que se podem mostrar sem vergonha.
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(Foto: Abutre no Estúdio, de João Onofre, em http://www.drawnbyreality.info/vulture.html)
O Brasil em Portugal, que decorrerá ainda em 2013, tem em Portugal no Brasil o contraponto tropical.
Só que se o Brasil optou por mostrar a sua cultura na antiga metrópole, Portugal preferiu mostrar por lá uma face empresarial.
Sorte portuguesa, azar brasileiro. É que Camões, Pessoa e Oliveira, sem ir mais longe, e para ficar só pela desmesura super-heróica, são produtos de luxo, bens exportáveis de grande valor transacionável.
Já as empresas portuguesas têm bem mais que se lhes diga. E não será no actual quadro de regime, com figuras como Pacheco Pereira arvoradas em intelectuais orgânicos, que se conseguirá perceber a importância da Arte e da Cultura para a promoção do país e para a criação de riqueza.
Se se imagina um estrangeiro que ao engano visite Constância para seguir os amores de Camões, procure a lisboeta basílica dos Mártis para ouvir o sino da aldeia de Pessoa, ou suba o Douro por causa de Oliveira, já se não imagina quem invista numa viagem para visitar os estabelecimentos da Jerónimo Martins ou uma barragem no Foz Côa.
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