Saltar para: Posts [1], Pesquisa e Arquivos [2]


 

Em 1969, a ditadura brasileira entrara definitivamente nos seus anos de chumbo. Por esses dias, os militares davam uso cada vez mais largo ao pau-de-arara. Na clandestinidade, Carlos Marighela publicava o Manual do Guerrilheiro Urbano, pouco antes de cair assassinado às mãos dos gorilas do DOPS. Julinho da Adelaide – alter-ego de Chico Buarque – preferia “chama[r] o ladrão” a confiar nos policiais, num dos refrões com que fintava a censura.

 

Em Salvador, a Polícia Federal não sabia o que fazer com Caetano Veloso nem com Gilberto Gil, após uma primeira detenção por subversão. A pedido do coronel Luís Artur, as autoridades acabaram por deixar os dois cantores dar um espectáculo para financiar a partida para o exílio inglês.

 

O concerto fez-se a 20 de Julho desse ano, no Castro Alves, o recém-inaugurado teatro baiano, no mesmo dia em que Neil Armstrong pisava a Lua. Gravado em péssimas condições técnicas registou Alegria, Alegria, hino do movimento Tropicalista; e a histórica primeira audição pública de Aquele, Abraço – um samba dedicado a Dorival Caymmi, João Gilberto e Caetano Veloso. O show repetiu-se no dia seguinte e o resultado pode ouvir-se no som precário de Barra 69.

 

Alegria, Alegria – paródia e homenagem pop à MPB – segue de perto A Banda, provavelmente o maior sucesso popular de Chico Buarque. Os primeiros versos dos dois temas podem aliás cantar-se sobre qualquer uma das duas músicas e reflectem o mesmo estado de espírito: Se a moça de Chico, “Estava à toa na vida”, já o herói de Caetano, “Caminhava contra o vento/Sem lenço nem documento.”

 

Reforçando o lado eléctrico, Caetano tocava habitualmente a marcha carnavalesca acompanhado pelos Beat Boys – banda rock argentina que substituiu o desejado CR7, septeto ié-ié e formação típica da Jovem Guarda capitaneada pelo rei Roberto Carlos. E pela primeira vez numa letra brasileira falava-se em Coca-Cola. Convergência com os irmãos Campos, Oiticica, Pignatari, Glauber Rocha, a poesia Concreta e o Cinema Novo.

 

O concerto termina emotivo, impossível ignorar o contexto, com Aquele, Abraço – terna e irónica despedida de Gil ao Brasil. O rancor pelo exílio forçado não vence a beleza de um “Rio de Janeiro [que] continua lindo” nem a emoção e a mágoa por ter de abandonar “todo o povo brasileiro”. Uma canção de perdão e “aquele abraço para quem fica".

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 22:08

Erros de casting nas telenovelas portuguesas

por Tempos Modernos, em 03.11.12

 

Embora as não frequente, de vez em quando páro em zapping, e durante escassos minutos, numa ou outra telenovela portuguesa. O mais das vezes, textos medíocres, cenas de pastelão, num português sem espessura ou predicados.

 

Dancin'Days, que a SIC vai passando, é o remake português do original brasileiro, de Gilberto Braga, com Sónia Braga como protagonista.Corria o ano de 1978 quando foi produzida e passou pouco depois nos ecrãs da RTP1.

 

Sónia Braga tinha 28 anos e dava vida a Júlia Matos, uma ex-presidiária que cumprira 11 anos de prisão na sequência de um atropelamento mortal pelo qual fora considerada responsável.

 

Nada de especial. Sónia Braga tinha já densidade e maturidade suficientes. Pouco antes fizera Gabriela, Cravo e Canela e ar de ingénua foi coisa que nunca teve. Facilmente se tornava verosímil que 11 anos antes tivesse carta de condução e pudesse ser condenada em tribunal.

 

Na versão portuguesa, a coisa fia mais fina. A obsessão por actores imberbes (vendem melhor, dizem as produções aos actores mais velhos para os recusar) cai no ridículo. A portuguesa Joana Santos dá vida à personagem encarnada há mais de 30 por Sónia Braga. Tem 26 anos, mas podia ter menos. Só que faz o papel de uma mulher de 34.

 

Não contentes com a desadequação da escolha, resolveram os autores que a Júlia portuguesa terá cumprido 16 anos de prisão, em vez dos 11 previstos na história brasileira. Ou seja, a fazer fé na idade real e aparente da actriz, aos dez anos já  a pequena malhara com os ossos num estabelecimento prisional. E nem vale a pena referir a barbaridade de achar possível que um tribunal português condenasse a quase 20 anos de prisão uma recém-encartada mal saída da adolescência.

 

Autoria e outros dados (tags, etc)

publicado às 14:45


Mais sobre mim

foto do autor


Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.


Posts mais comentados


Arquivo

  1. 2018
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2017
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2016
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2015
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2014
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2013
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2012
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2011
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D