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No discurso de aceitação do prémio Camões, o escritor Raduan Nassar criticou o governo de Michel Temer e o Supremo Tribunal Federal brasileiro.

 

E, a seguir, Roberto Freire, ministro da Cultura de Temer, disse ao escritor que "quem dá prémio a um adversário político não é a ditadura" e acrescentou também que quem dá o prémio é o Governo brasileiro. O governante percebe mal o que caracteriza uma democracia e pelo caminho ainda provoca um conflito diplomático. Freire esqueceu-se de modo deselegante da contraparte portuguesa, que é tida e achada nesta questão. Atribuído pela primeira vez a Miguel Torga, em 1989, o prémio é subsidiado não apenas pelo governo brasileiro, mas também pelo português. Foi criado em conjunto pelos dois países. E é atribuído por causa da língua comum e não por qualquer poder político de turno. É o mais importante prémio literário da língua portuguesa, mas Freire vê-o como instrumental. O ministro da Cultura brasileiro sugere mesmo que se Nassar não gosta do Governo devia recusar o prémio.

 

Este tipo de pensamento não é original. Já há um par de anos, na entrega do Grande Prémio do Romance e Novela da Associação Portuguesa de Escritores, Jorge Barreto Xavier, secretário de Estado da Cultura do Governo de Passos Coelho e de Paulo Portas, disse à premiada, Alexandra Lucas Coelho, que ela devia estar grata por viver em democracia o que lhe permitia ter feito um discurso de aceitação do prémio onde batia no Governo e em Cavaco. Xavier terá acrescentado ainda que se a autora estava a receber os quinze mil euros do prémio isso também se devia ao Governo que o subsidiava.

 

Nos dois governantes, uma mesma crença. A de que a língua lhes pertence a eles. É também um querer castrar a voz do outro. Uma voz permitida se fizer parte de um ritual. E uma voz não tolerada se se quiser tornar acção.

 

 

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publicado às 13:53

Há um par de semanas, Pedro Tadeu defendeu que se ensine a ler os jornais e a ver televisão nas escolas - em linha, disse ele, com ideia semelhante de Pacheco Pereira. Já esta semana, queixou-se de que alguns querem alargar o número de incompatibilidades dos jornalistas e defendeu em vez disso uma declaração obrigatória de interesses.

 

Confesso que, em regra, sem ter nada de especial contra aquelas ideias, tenho sempre muita dificuldade em seguir a bondade para o jornalismo das soluções defendidas por Pedro Tadeu.

 

Há um par de anos, em vários debates (aqui e aqui, por exemplo) com Oscar Mascarenhas, então provedor do leitor do Diário de Notícias, o cronista defendia a total abertura da caixa de comentários do jornal - um poderoso íman de grunhice alarve cujo contributo à liberdade de expressão e à qualidade da informação é nulo.

 

Debaixo do aparente espírito libertário que perpassa a superfície, esconde-se uma montanha perversa. Esta ideia, tal como as dos seus dois recentes textos, é mais uma vez ruído e passa ao lado do essencial. Só que, Infelizmente, o que diz Tadeu corre bem o risco de parecer ajuda à solução de alguma coisa.

 

Ontem, António Guerreiro, no Público, escreveu mais um texto exemplar acerca da realidade dos jornais e das relações culturais de produção, desta vez a partir daquilo a que chamou "equívocos" de Pacheco Pereira. O assunto não é, sequer, alguma vez convocado, mas intersecta-se com questões como essa da educação para os media. Um ponto principal de conclusão do texto passa, talvez, pela ideia de que não é possível denunciar o processo daquilo que Guerreiro aproveita e que também chama, com alguma ironia, "nova ignorância" e "degeneração da cultura" e participar "activamente nos meios que a produzem". 

 

Sem necessidade de lembrar Platão e o muito velho discurso contra os novos, siga-se com António Guerreiro. O jornalista  apresenta uma tipologia dos nomes dados no último século a algo designado como "ignorância e degeneração da cultura": "tragédia da cultura", crise da cultura", "formas inautênticas da amizade", "semi-cultura", "amnésia planificada".

 

Até pelo continuado cenário se percebe que podem dar-se aulas disso às criancinhas, mas não é possível educar para ler os jornais. O grosso dos jornalistas andou nos desnecessários cursos de comunicação social a ler Merleau-Ponti, Foucault, Deleuze, Derrida e não aprendeu a lê-los. Chegam aos jornais e continuam por lá sem questionar as condições de produção do seu próprio discurso diário, sem saber sequer que isso existe e de que não se trata de minhoquices. Aliás, se se questionarem, neste momento, nem lá ficam.

 

Os jornalistas têm obrigações constitucionais de informar. E como bem lembra Alfredo Maia, têm até um código deontológico a respeitar. E está lá tudo. E não é preciso pensar nem em educação do povo, nem em aumento das incompatibilidades dos jornalistas. Ambas as propostas fazem tábua rasa das responsabilidades próprias da classe. E procura-se resolver no exterior o que são problemas e responsabilidade internas e diárias não assumidas pela corporação. Como diz a velha piada, basta um psicólogo para mudar uma lâmpada. É preciso é que a lâmpada queira mesmo mudar.

 

Acredita-se o mais das vezes naquilo em que se quer acreditar. Não anda aí a peregrina a ideia de pós-verdade, uma coisa velha de nome novo? O que as pessoas precisam de saber é que há um espaço onde se quiserem podem conhecer, em tempo real, e enquanto acontecem, os factos que cimentam as convicções. E, desejavelmente, esse espaço são os jornais. O drama é que, hoje, ninguém acredita que seja lá.

 

 

 

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publicado às 09:59

A indignação impensada e ruidosa (reeditado)

por Tempos Modernos, em 11.12.16

Está na casa dos vinte ou dos trinta anos. Aguarda na reprografia da Biblioteca Nacional que lhe acabem de copiar várias páginas de uns grandes e grossos volumes de lombada oitocentista e estragada.

 

E indigna-se. Onde é que já se viu fazer na Biblioteca Nacional a cerimónia da entrega do espólio de José Saramago, que terá a presença de António Costa. Devia ser no Centro Cultural de Belém, que aquilo está cheio de salas vazias, onde se gastaram milhões e a que não se dá o uso prometido aquando da construção, assevera.

 

Pouco interessa ao indignado que se trate da entrega do espólio do Nobel da Literatura de 1998 à Biblioteca Nacional de Portugal. Onde tinha de se realizar a cerimónia era no CCB. Lá nessas salas do centro cultural lisboeta é que tinha de ser entregue o espólio à nacional biblioteca, que era para dar uso ao equipamento alegadamente parado.

 

Por acréscimo, achará, talvez, que uma biblioteca é um depósito de livros. Uma coisa sem vocação para mais nada. Ao indignado, também não ocorreu a contenda entre Saramago e Cavaco. Ou o que a construção do Centro Cultural de Belém significa na política cultural cavaquista.

 

Podem passar-se horas com livros à frente e não se dizer coisa com coisa.

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publicado às 12:27

"Essa é pro querido ouvinte/Do Interior"

por Tempos Modernos, em 15.11.16

 

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publicado às 13:52

"Cáli-ce"

por Tempos Modernos, em 04.11.16

 

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publicado às 17:18

Dylan e Buarque

por Tempos Modernos, em 13.10.16

Agora que deram o Nobel da Literatura a um cantor, será que lhes ocorre dar o Camões a Chico Buarque?

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publicado às 12:22

Público errava esta manhã ao dizer que nenhum escritor masculino norte-americano vencia o Nobel da Literatura desde John Steinbeck, em 1962. Apenas se lembrariam de Toni Morrison, uma mulher negra.

 

Agora, com a há muito anunciada vitória de Bob Dylan podem fazer antes outra estatística. Para os Estados Unidos, desde que John Steinbeck venceu o Nobel da Literatura em 1962, o prémio foi entregue quatro vezes a autores homens de origem judaica (Saul Bellow, Isaac Bashevis Singer, Josip Brodsky, Dylan) e a uma mulher de origem africana.

 

 

 

 

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publicado às 12:12

Em dia de Nobel da Literatura escreve-se que nenhum homem dos EUA vence o prémio há mais de 50 anos, desde John Steinbeck, em 1962. É um erro que em tempos de Google não se justifica.

 

Ora, de cor, aqui sentado na poltrona, de cor, alinho já Josip Brodsky, Isaac Bashevis Singer e Saul Bellow. Os dois primeiros são naturalizados e até nem escreveram em inglês. Já Bellow, o primeiro do trio a ser premiado, salvo erro em 1976, é um escritor masculino norte-americano tão escritor masculino norte-americano como Steinbeck.

 

Será aliás um dos motivos para se ir afastando Philip Roth da corrida. Valerá a pena premiar a cópia, um eterno preferido dos jornalistas portugueses, quando o original já venceu? Será este ano?

 

Nota final: continuando pelos EUA, em certa medida, o também nobelizável Don De Lillo, com a sua reflexão sobre a televisação e espectacularização da realidade, seria um premiado na linha do hoje desaparecido Dario Fo.

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publicado às 09:59

É a segunda vez, em pouco tempo, que vejo mal atribuída a Woody Allen a frase "Conhecia-a antes de ser virgem".

 

Santana Castilho usa-a como título de artigo "Conheci o PS antes de ser virgem", referindo-se ao papel do partido no sector da educação. Termina o comentário atribuindo a ideia a Woody Allen.

 

Ora, a frase tem origem hollywoodesca, sim, mas é mais antiga. E refere-se orginalmente a Doris Day, uma das louras de Alfred Hitchock, o cineasta com quem trabalhou em O Homem que sabia demais e a quem também já vi a frase atribuída.

 

O autor da frase terá sido Oscar Levant, o sarcástico e demolidor pianista de Um Americano em Paris. Em The memoirs of an amnesiac, a autobiografia que publicou em 1965, recorda a sua última participação num filme da Warner. Fora em 1948, em Romance no Alto Mar, de Michael Curtiz. "Foi o primeiro filme de Doris Day; isso foi antes de ela se tornar virgem", escreveu.

 

 

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publicado às 13:22

Dificuldades da via referendária

por Tempos Modernos, em 07.08.16

Problemas dos referendos num par de respostas do escritor Ian McEwan, em entrevista ao Diário de Notícias:

“David Cameron fez uma aposta com o referendo, achando que fixaria uma posição definitiva em relação à União Europeia por várias gerações. Só que falhou! […] o referendo do brexit foi um plebiscito hitleriano com uma margem de 4% […] o referendo apenas tirou a fotografia ao sentimento nacional de um único dia, obrigando a rever um tratado e a absorver a energia nacional noutra direção. O que nos sairá caro.”

Os referendos sobre o futuro de um país tendem a amarrar os povos a posições definitivas, ao contrário das eleições que permitem mudar políticas de quatro em quatro anos. Não dá para saírem e voltarem a entrar quando se fartarem. E terá sido nisso que Cameron pensou. Segundo o escritor, o ex-primeiro-ministo britânico acreditava que através do referendo amarraria sucessivas gerações de governantes à União Europeia.

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publicado às 15:20


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