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Os Estados Unidos elegem um presidente racista, sexista, intolerante, que ameaça com deportações massivas, violações de direitos humanos.
E os mercados financeiros norte-americanos respondem-lhe em alta.
Explica-se devagarinho.
Uma pessoa - homem ou mulher, não interessa - tem um filho. Separa-se, divorcia-se, enviúva. O parceiro deixa de se interessar pela cria, desaparece, as opções são muitas e diversas.
Essa pessoa decide viver maritalmente com alguém do mesmo sexo. As duas pessoas criam a criança em conjunto, durante anos. Absolutamente nenhuma lei proíbe
Quem as proíbe de o fazer?
O progenitor morre. Quem fica com a criança? Os avós, se os houver? Os irmãos do progenitor? A lei defende que seja alguém da família.
Alguém que possa, alguém que queira. No caso de casais heterossexuais, a lei tem o mecanismo da co-adopção. O parceiro sobrevivente, de outro sexo, pode co-adoptar a criança, mantendo-a dentro da família nuclear em que sempre viveu.
Na falta, primeiro, do dito parceiro do seu progenitor, com quem vivia. Na ausência, depois, dos avós, dos tios, dos parentes, o Estado assegura, através de instituições próprias e de instituições contratadas, a tutela do menor, a sua criação.
O que a lei da co-adpoção, agora chumbada pelos votos da maioria PSD/CDS-PP, visava, era tão só garantir que a criança não perdesse a tutela dos seus mais próximos, da pessoa com quem já vivia enquanto o seu progenitor era vivo. Abria aos homossexuais a possibilidade já existente para hetereossexuais.
Ou seja, a co-adopção implica que duas pessoas criando em conjunto o filho ou os filhos de uma dela, filho ou filhos sem outro progenitor disponível que não o pertencente a este casal, possam legalmente continuar a assegurar a tutela e criação do menor em caso de falecimento do progenitor biológico. A co-adopção, impede, pois, que a criança seja retirada do meio onde vive.
No limite, o que PSD e CDS-PP –através de processo iniciado pela inenarrável Jota laranja e pelo seu igualmente inenarrável secreta-geral - defendem é a institucionalização e entrega aos Estado dos filhos naturais de homossexuais.
E basta ler os comunicados e ouvir as intervenções dos deputados da maioria e de mais meia dúzia de interventores (de que Marinho Pinto será dos mais irresponsável. Enquanto bastonário não se lhe admite a deturpação que fez acerca do que estava em causa), para perceber que chumbaram esta lei, argumentando como se se tratasse de uma lei de adopção por casais de homossexuais.
Como se o que estivesse em causa, fosse a adopção por casais de homossexuais de crianças que não tivessem laços biológicos com crianças disponíveis para adopção. Um embuste levado a cabo pela maioria.
O comentário de hoje do provedor do leitor do Diário de Notícias é o que se chama uma peça assinalavelmente higiénica.
Exemplifica como se deve lidar com detritos que alguns jornais e revistas publicam sob a forma de artigo de opinião.
(Foto: oliveirasalazar.org)
Não é que viesse grande mal ao mundo se uma meia-dúzia de garrafas de vinho produzidas a partir da baga - agreste casta da região do Dão - fosse vendida sob o nome comercial de Memórias de Salazar. Aquilo deverá andar perto do intragável para paladares habituados à macieza do Douro e do Alentejo e sempre se ficava a conhecer a identidade dos produtores que tal referência querem aproveitar.
No entanto, o Instituto Nacional da Propriedade Intelectual não autorizou o uso da marca Memórias de Salazar, por recear que a ordem pública fosse posta em causa. Soa a cautela a mais: o mais provável era que o eventual prejuízo das quebras anormais nos pontos de venda recaísse sobre as seguradoras.
Nos blogues da direita, nalguns institutos e jornais, há sempre quem se horripile com insinuações de que têm alguma tolerância com um passado "salazarento". Desta vez não será diferente e voltarão a dizer que já era tempo de acabarem estes sinais "de falta de maturidade democrática".
A indignação é mais que previsível. Estes desassombrados braços-de-ferro, pendões da liberdade de espírito, vêm sempre das bandas dos eleitores e eleitos da direita (o promotor da ideia, o autarca João Lourenço, é do PSD).
No fundo, este tipo de ponto de honra é uma opção tão válida como outra qualquer para averiguar se Portugal é um país realmente livre. E aposta-se até que se o referido Lourenço fosse nascido há 50 anos teria demonstrado idêntico destemor e quiçá passado, como outros passaram, pela António Maria Cardoso.
(Foto: dinheirovivo.pt)
A Amnistia Internacional não tem cores políticas. É discreta, institucional e venceu o Nobel da Paz em 1977. Merecidamente.
Tanto condena as violações de direitos humanos cometidas por governos de esquerda como as cometidas por governos de direita. Tanto condena forças estatais como grupos paramilitares ou movimentos de guerrilha. Declaração de interesses: fui membro e activista da Secção Portuguesa.
Se a Amnistia considera que a polícia recorreu ao uso excessivo e desproporcional da força contra os manifestantes que ontem pacificamente protestavam em Lisboa, o Ministério da Administração Interna e as forças de segurança devem tomar boa nota do comunicado.
Estar sob a mira da Amnistia Internacional por causa da forma como se reprimem desacatos numa manifestação não é motivo de orgulho para nenhum governo. Muito menos quando responsáveis políticos parecem sempre demasiado lestos a desculpar qualquer comportamento policial.
E as acusações feitas pela Ordem dos Advogados também não deixam ninguém descansado: pessoas detidas indevidamente, mais do que o tempo legalmente permitido, autos em branco, recusa do acesso a advogados. Desde pelo menos 24 de Novembro de 2011 que a polícia ultrapassa claramente os limites permitidos num Estado democrático.
Que o DIAP mande arquivar queixas contra agentes da PSP filmados a agredir um suspeito, já controlado e manietado no chão, ou que alguns jornalistas não considerem essencial ouvir explicações governamentais torna tudo muito mais preocupante.
A mentir ao hospital para ter pensos à borla.
(Foto: radiocampanario.com)
A TSU teve o condão de despertar uma grande maioria de portugueses para a injustiça da governação do PSD/CDS-PP e da presença da tróica. Foi quando perceberam que lhes iam aumentar os descontos para a reforma não para fazer face às dificuldade da Segurança Social, mas para transferir o dinheiro obtido para as contas dos seus patrões.
Acordou-se. Em todos os quadrantes ideológico. Em todos os sectores profissionais. Mais vale tarde que nunca. Só que há um problema. É que o esbulho, que outro nome se lhe pode dar?, não é de agora. E continua.
Já há muitos anos que os portugueses andam a transferir o seu dinheiro para o bolso dos patrões. Conheci muitos e muitos estagiários, licenciados, a quem os pais pagavam para trabalhar. Vindos de fora de Lisboa, alguns ganhavam menos que o salário mínimo, insuficiente para fazer face às despesas com transportes, alimentação e habitação, e trabalhavam às dez e doze horas diárias. Isso não impedia que chefias recebessem anualmente prémios de dezenas de milhares de euros pelo sucesso comercial do empreendimento ou que o patrão pudesse perder 50 milhões de euros em bolsa. E nem falo do meu caso.
Sucessivos códigos laborais (de Bagão Félix, de Vieira da Silva, de Pedro Mota Soares, CIP, CCP, CAP e UGT) aumentaram o tempo de trabalho, flexibilizaram-no, acrescentaram-lhe mais meia-hora, cortaram feriados, desvalorizaram o valor das horas extraordinárias e do trabalho suplementar, esmagaram indemnizações, desestruturaram vidas familiares e atiraram as mais valias resultantes da coisa para o bolso de patrões, que nem por isso contrataram mais gente.
No fundo, é o efeito pimba. O gosto está por educar e o óbvio vence. Isso explica o sucesso de Tony Carreira em contraponto com, por exemplo, Amélia Muge, uma compositora de excepção. Só quando a coisa se torna muito evidente é que a população a percebe.
Pelo menos um dos sindicatos da PSP (o Sindicato Nacional da Polícia), alertou a corporação para a necessidade de não se deixar "instrumentalizar" e "virar o «cidadão manifestante» contra o «cidadão polícia»".
Do que me recordo, é a primeira vez no passado recente que forças da autoridade chamam a atenção para a intensidade do uso da força policial.
O apelo é feito a poucas horas das manifestações contra a austeridade que hoje se realizam em vários pontos do país e na sequência de acidentes entre manifestantes e autoridades a 24 de Novembro de 2011 e 23 de Março do corrente, entretanto justificados pela PSP e pela Procuradoria Geral da República.
O referido sindicato não deixa de apelar ao zelo "pela segurança dos cidadãos" e à " manutenção da paz e tranquilidade pública".
Em directo das ruas de Lisboa, na SIC Notícias, uma jornalista resume a posição de um sindicato, não apanhei se será o mesmo, apenas com base nesta última linha. O apelo ao civismo dos manifestantes. Ao passar para a peça noticiosa, um dirigente do sindicato vinca os dois aspectos, o referido pela jornalista e o da contenção policial.
Os ângulos jornalísticos e os critérios editoriais evidenciam sempre uma escolha. Eu não teria feito o mesmo resumo da minha camarada da SIC-Notícias. Os apelos à calma dos manifestantes não têm faltado, já a chamada à calma dos polícias tem outro grau de novidade.
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