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Vale o que vale, que as votações foram secretas e nada se pode concluir com rigor.
Na eleição para presidente da Assembleia da República, Ferro Rodrigues foi eleito com 120 votos. Fernando Negrão, o candidato da coligação governamental, acabou derrotado obtendo 108 votos. Houve duas abstenções. Fazendo umas continhas sabe-se que a Esquerda tem 122 votos, 86 parlamentares do PS, 19 do BE, 17 da CDU. A Direita, 107. Ou seja, o candidato do PSD e do CDS-PP conseguiu mais um voto do que aquilo que estava, à partida, garantido. Admitindo a existência de grupos parlamentares relativamente disciplinados, e também de vasos comunicantes, de onde terá vindo o voto a mais na Direita?
Depois, houve a eleição dos vice-presidentes do parlamento. Vota-se aceitando ou rejeitando os candidatos. Jorge Lacão, candidato do PS somou 122 votos, nem mais um. Todos os outros candidatos, até José Manuel Pureza, do BE, tiveram votos de aceitação de deputados da Direita. Apenas Jorge Lacão não obteve mais votos do aqueles que lhe garantiria a soma aritmética dos votos da Esquerda coesa e unida.
Nos votos à justa de Lacão, onde não se insinua qualquer trânsfuga, e no voto a mais de Fernando Negrão, não andará a participação de André Silva, o eleito do PAN? Que novidades trará a apresentação do Governo Passos Coelho-Portas?
(Fonte: economico.sapo.pt)
Como bem se sabe, é de direita todo aquele que diz já não existirem diferenças entre esquerda e direita.
Questionado no Público sobre o repensar das funções constituicionais do Estado, Ferro Rodrigues, chefe da bancada parlamentar socialista, responde que
Ao exprimir o desejo de que o estabelecimento das funções estatais continuem a dividir esquerda e direita, manifesta dúvidas subliminares quanto à firmeza de convicções ideológicas do PS, partido de que foi secretário-geral e que apenas umas perguntas antes dizia ser o partido mais à esquerda do espectro partidário português.
Ferro, o PS e o país ganhariam mais em resolver as contradições dos seus, do que em acenar fantasmas antigos e procurar perigos e contradições na restante esquerda como faz na mesma entrevista. A agenda da década, apresentada há dias por António Costa, mostra que os socialistas pouco aprenderam com a crise, sobre as suas causas e o seu papel nela. A situação portuguesa concreta resulta de acções e decisões postas em prática pelos que estiveram presentes no Governo. Nunca da ausência de outros, independentemente da leitura de responsabilidade por essas não presenças que o chefe da bancada rosa possa fazer.
E é pena que não resolvam as contradições. João Galamba, Pedro Nuno Santos e Pedro Adão e Silva, que pertenceu ao secretariado de Ferro Rodrigues, têm escrito coisas acertadas e inteligentes (aqui, aqui, aqui, ou aqui, por exemplo). Não se vê é como poderão pô-las em andamento com os caminhos traçados pela direcção que apoiam e ainda agora elegeram.
(Foto: dn.pt)
O tempo de Ferro Rodrigues à frente do PS terá passado e possivelmente nem indicável para Belém será.
Mas com Manuel Maria Carrilho é dos poucos socialistas a perceber que o mundo mudou substancialmente e que o país já não vai lá com alternâncias.
Para que o PS venha a tornar-se verdadeiramente útil e consequente, ainda terá de queimar António Costa. O autarca de Lisboa pouco mais representa que a dança de lugares.
Sócrates soube convocar para as listas de deputados a esquerda socialista.
Ferro Rodrigues foi o escolhido para combater por Lisboa, mas, mais uma vez, defende alianças com o PSD e o CDS os outros dois partidos que governam o país desde 1975.
Quem quiser soluções que não passem pelo rolo cilíndrico social do FMI não vota no PS, mesmo que traga Ferro e Alegre na lapela para dar ares de esquerda.
Em 2002, Ferro Rodrigues, em entrevista ao El País, pouco antes das legislativas em que seria derrotado por Durão Barroso, acusou o PCP pela queda do Governo de Guterres. Que tinham votado contra leis positivas e que não tinham aprovado orçamentos do PS. Nesses tempos, dos dois governos minoritários de António Guterres, os orçamentos foram aprovados sucessivamente, e por exemplo, por coligações (e nalguns casos abstenções) com os deputados madeirenses do PSD ou com Daniel Campelo e seu queijo limiano, do CDS.
Agora, transformado em flor esquerdista na lapela de Sócrates, que o manteve convenientemente afastado na OCDE, Ferro Rodrigues aceitou ser o cabeça-de-lista do PS por Lisboa. Os socialistas recuperam a narrativa e Ferro Rodrigues está mais uma vez nesse epicentro. Depois de seis anos de Governo, convergindo e aprovando orçamentos com a Direita, no PS pisca-se o olho ao voto útil dos eleitores de Esquerda. Acusa-se o PCP e o BE de impedirem convergências.
Desde que governa em minoria, o PS tem a desculpa da estabilidade para recorrer aos apoios do PSD e CDS para ver aprovadas iniciativas parlamentares. Sempre pode acusar Bloco e PCP de não colaborar.
Menos congruente é que antes, em maioria, os socialistas tenham encontrado quase sempre – é fazer as contas – os mesmos parceiros. Nos primeiros quatro anos de Sócrates, qualquer colaboração era desnecessária.
Teriam sempre as iniciativas aprovadas apenas com os seus próprios votos. Não precisavam para nada do PSD ou do CDS-PP e escusavam de dizer que só a intransigência dos bloquistas e comunistas os fazia violentar o seu ADN de Esquerda.
Manuel Alegre é outra louça, diferente de Ferro Rodrigues. E volta a estar ao lado do partido de (quase) sempre. Nos momentos cruciais foi o que sempre fez. Palpita que não por qualquer calculismo político seu - não parece capaz disso - mas antes por calculismo do partido. Os vaidosos têm o defeito de cair com poucas cantigas.
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