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Está na casa dos vinte ou dos trinta anos. Aguarda na reprografia da Biblioteca Nacional que lhe acabem de copiar várias páginas de uns grandes e grossos volumes de lombada oitocentista e estragada.
E indigna-se. Onde é que já se viu fazer na Biblioteca Nacional a cerimónia da entrega do espólio de José Saramago, que terá a presença de António Costa. Devia ser no Centro Cultural de Belém, que aquilo está cheio de salas vazias, onde se gastaram milhões e a que não se dá o uso prometido aquando da construção, assevera.
Pouco interessa ao indignado que se trate da entrega do espólio do Nobel da Literatura de 1998 à Biblioteca Nacional de Portugal. Onde tinha de se realizar a cerimónia era no CCB. Lá nessas salas do centro cultural lisboeta é que tinha de ser entregue o espólio à nacional biblioteca, que era para dar uso ao equipamento alegadamente parado.
Por acréscimo, achará, talvez, que uma biblioteca é um depósito de livros. Uma coisa sem vocação para mais nada. Ao indignado, também não ocorreu a contenda entre Saramago e Cavaco. Ou o que a construção do Centro Cultural de Belém significa na política cultural cavaquista.
Podem passar-se horas com livros à frente e não se dizer coisa com coisa.
O El Pais contabiliza as línguas do Nobel da Literatura. Vinte e sete autores de língua inglesa, 14 da francesa, 13 da alemã e 11 da espanhola. Os 11 premiados em espanhol (espanhóis mesmo espanhóis apenas cinco: Echegaray, Benavente, Jiménez, Aleixandre e Cela) são ultrapassado pelos premiados em francês e alemão, duas línguas com menor peso de falantes. Também há seis premiados que escreveram em russo - tantos quanto os vencedores italianos e menos um que os suecos, que, de qualquer modo, jogam em casa.
Mas o que o periódico quer vincar é o desequilíbrio a favor dos idiomas ocidentais, contra línguas tão faladas como o chinês (Gao Xingjian e Mo Yan), o japonês (Yasunari Kawabata e Kenzaburo Oe), o árabe (Naguib Mahfouz), o bengali (Rabindranath Tagore, já em 1913). Este enviesamento tem razões históricas.
Até por isso, mais notório se torna o muito residual peso do português entre os vencedores do galardão. Num prémio que tem sido tão ocidentalizado, um país ocidental, detentor de uma das seis línguas mais faladas do mundo (por causa do Brasil), com uma literatura cultivada desde o século XIII, consegue ter apenas um vencedor - José Saramago, em 1998.
(Foto: fotos.sapo.pt)
“Para a forca hia um homem: e outro que o encontrou lhe dice: Que he isto senhor fulano, assim vay v. m.? E o enforcado respondeo: Yo no voy, estes me lleban.”
Pe Manuel Velho, in Memorial do Convento, 1982
(Foto: blogue do movimento Direito Para Quem?)
A RTP-Memória exibiu, já esta madrugada, um Falatório de 1997, programa emitido originalmente em directo, onde Clara Ferreira Alves entrevistava/conversava com José Saramago, Sebastião Salgado e Chico Buarque, a propósito de Terra, trabalho conjunto sobre o Movimento dos Sem Terra na sequência da chacina do Eldorado dos Carajás. Tão serviço público na altura como o é agora.
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