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Há um par de semanas, Pedro Tadeu defendeu que se ensine a ler os jornais e a ver televisão nas escolas - em linha, disse ele, com ideia semelhante de Pacheco Pereira. Já esta semana, queixou-se de que alguns querem alargar o número de incompatibilidades dos jornalistas e defendeu em vez disso uma declaração obrigatória de interesses.
Confesso que, em regra, sem ter nada de especial contra aquelas ideias, tenho sempre muita dificuldade em seguir a bondade para o jornalismo das soluções defendidas por Pedro Tadeu.
Há um par de anos, em vários debates (aqui e aqui, por exemplo) com Oscar Mascarenhas, então provedor do leitor do Diário de Notícias, o cronista defendia a total abertura da caixa de comentários do jornal - um poderoso íman de grunhice alarve cujo contributo à liberdade de expressão e à qualidade da informação é nulo.
Debaixo do aparente espírito libertário que perpassa a superfície, esconde-se uma montanha perversa. Esta ideia, tal como as dos seus dois recentes textos, é mais uma vez ruído e passa ao lado do essencial. Só que, Infelizmente, o que diz Tadeu corre bem o risco de parecer ajuda à solução de alguma coisa.
Ontem, António Guerreiro, no Público, escreveu mais um texto exemplar acerca da realidade dos jornais e das relações culturais de produção, desta vez a partir daquilo a que chamou "equívocos" de Pacheco Pereira. O assunto não é, sequer, alguma vez convocado, mas intersecta-se com questões como essa da educação para os media. Um ponto principal de conclusão do texto passa, talvez, pela ideia de que não é possível denunciar o processo daquilo que Guerreiro aproveita e que também chama, com alguma ironia, "nova ignorância" e "degeneração da cultura" e participar "activamente nos meios que a produzem".
Sem necessidade de lembrar Platão e o muito velho discurso contra os novos, siga-se com António Guerreiro. O jornalista apresenta uma tipologia dos nomes dados no último século a algo designado como "ignorância e degeneração da cultura": "tragédia da cultura", crise da cultura", "formas inautênticas da amizade", "semi-cultura", "amnésia planificada".
Até pelo continuado cenário se percebe que podem dar-se aulas disso às criancinhas, mas não é possível educar para ler os jornais. O grosso dos jornalistas andou nos desnecessários cursos de comunicação social a ler Merleau-Ponti, Foucault, Deleuze, Derrida e não aprendeu a lê-los. Chegam aos jornais e continuam por lá sem questionar as condições de produção do seu próprio discurso diário, sem saber sequer que isso existe e de que não se trata de minhoquices. Aliás, se se questionarem, neste momento, nem lá ficam.
Os jornalistas têm obrigações constitucionais de informar. E como bem lembra Alfredo Maia, têm até um código deontológico a respeitar. E está lá tudo. E não é preciso pensar nem em educação do povo, nem em aumento das incompatibilidades dos jornalistas. Ambas as propostas fazem tábua rasa das responsabilidades próprias da classe. E procura-se resolver no exterior o que são problemas e responsabilidade internas e diárias não assumidas pela corporação. Como diz a velha piada, basta um psicólogo para mudar uma lâmpada. É preciso é que a lâmpada queira mesmo mudar.
Acredita-se o mais das vezes naquilo em que se quer acreditar. Não anda aí a peregrina a ideia de pós-verdade, uma coisa velha de nome novo? O que as pessoas precisam de saber é que há um espaço onde se quiserem podem conhecer, em tempo real, e enquanto acontecem, os factos que cimentam as convicções. E, desejavelmente, esse espaço são os jornais. O drama é que, hoje, ninguém acredita que seja lá.
Apesar dos jornalistas que descobrem em declarações da área do PSD e do CDS-PP a defesa do país contra as sanções de Bruxelas, há gente menos optimista. Pacheco Pereira acredita haver gente no PSD, por exemplo, que quer as sanções e que precisa delas do ponto de vista político.
Claro que há sempre outras leituras, mas eu não confiaria em boa parte dos meus camaradas jornalistas no activo para trocarem certas proposições partidárias por miúdos. Quando, há dias, Schäuble se lembrou de sugerir um segundo resgate para Portugal, o melhor que ocorreu a Assunção Cristas para defender o País foi que "gostaria que Portugal, de facto, não se pusesse nos radares e não se pusesse na situação de ser objecto de comentários, porventura menos felizes".
Na ocasião, um canal televisivo fez a súmula de posições dos partidos em relação às declarações do ministros das Finanças alemão. Nela dava conta que todos os partidos se tinham manifestado contra as declarações de Schäuble. Uns de modo mais emocional, outros de de modo "mais assertivo", disse a jornalista referindo-se às declarações da presidente do CDS-PP.
Confesso que me pareceu forçado ver nas declarações de Assunção Cristas a condenação das declarações de Schäuble. Primeiro condena Portugal, que se põe a jeito, depois considera as declarações "porventura menos felizes". Ou seja, se as declarações são "porventura menos felizes", também podem não o ser. É isso que o porventura quer dizer.
Com aquele porventura, Assunção Cristas põe a hipóteses de as declarações serem infelizes, mas também abre a porta para que a afirmação de Schäuble tenha sido feliz. Se nestas declarações da antiga ministra da Agricultura havia qualquer assertividade condenatória do alemão, eu ia ali e já vinha.
Cavaco enviou para o Constitucional a suspensão da avaliação dos professores.
Mas já não se sabia? O doutrinador Pacheco Pereira tinha criticado o partido de Passos Coelho por ter suportado a medida. A decisão presidencial seria questão de dias.
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