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José Saramago disse algumas vezes que o comité Nobel não atribuía o prémio a escritores de países com vencedores ainda vivos. Não será bem assim. Neste momento coexistem alguns vencedores do mesmo país.
Não será bem, como Saramago dizia, e já na altura não seria bem assim. Nadine Gordimer, por exemplo, estava ainda viva quando entregaram o prémio ao igualmente sul-africano Coetzee. Hoje, coexistem, os norte-americanos Toni Morrison e Bob Dylan; os franceses Le Clézio e Modiano; os britânicos, curiosamente ambos de origem exótica, V.S. Naipaul e Ishiguro; e Gao Xingjian e Mo Yan, da China cujos escritores andaram quase 100 anos arredados do prémio
A comunicação social engole bem estes leitmotivs. Aprecia generalidades e repetições. Ao contrário do que se esperaria, a novidade nunca é bem-vinda. Embora nos últimos anos alguns temas em redor do Nobel tenham esmaecido, durante muito tempo havia dois tópicos recorrentes, abertura do grosso dos comentários sempre que o Comité Nobel anunciava o novo vencedor:
Mas ao contrário do que se esperaria, a repetição de factos faz pouco pela aprendizagem. Alguns ainda hoje se admiram com as escolhas suecas. Vêem surpresa em muitos vencedores. Um editor de cultura de uma revista norte-americana nunca tinha ouvido falar de Le Clézio. E os jornalistas portugueses lêem muito a imprensa anglo-saxónica que se espanta com o que não conhece. Se conhecessem o catálogo da Assírio & Alvim não se teriam espantado. Mas existe uma espécie de complexo adâmico em muita desta gente. Não descobriu ainda que já existia mundo antes de nascerem.
Mas direito (mais ou menos) ao que interessa. Como adivinhar quem será o próximo Nobel da Literatura? Há uns anos fiz uma lista de futuros vencedores da coisa. Mandei-a amigos. Já de lá caíram vários autores. Alguns caíram mortos, outros caíram por terem vencido o prémio.
Não há nenhuma ciência nestas listas. E os prémios literários também já não são o que nunca foram. Com isto assentado, nenhuma lista é objectiva ou vale grande coisa, embora os jornais gostem de as publicar e os leitores gostem de as ler. Suscitam discussão, geram pasmo, motivam discordâncias. Na melhor das hipóteses dão a descobrir coisas que não se conheciam e abrem o apetite para outras
Há algumas línguas de grande projecção universal, com forte peso cultural, ao menos nos meios ocidentais. O inglês, o francês, o espanhol. Mas também o alemão, o italiano e o russo, mais limitados no alcance. Será natural que saiam vencedores de países que falem estas línguas. Primeiro dos grandes países que falam estas línguas, depois das suas antigas colónias. Principalmente das que tenham uma vida editorial mais estabilizada e com tradição, como é o caso das sul-americanas.
Interessam também algumas línguas muito faladas mas com pouca expressão no Nobel. Mostram o seu peso no mercado editorial mundial. Português, Árabe, Chinês, Hindi, Japonês.
Dos países que falam estas línguas, há um grupo grande de escritores de projecção mundial. São dos primeiros a considerar. E apontar aos autores maduros. Raramente a coisa é dada a gente abaixo dos 50, como Kypling, Camus, Lewis, Brodsky. Depois, há as idiossincrasias de cada língua e cultura. Alguns autores não se enquadram neste esquema quase pronto-a-vestir. Veja-se o holandês Cees Nooteboom, cujo país nunca teve galardoados, mas cujo nome aparece com frequência nas casas de apostas como favorito.
O inglês é divido por muitos outros países como língua comum. Grã- Bretanha e EUA, como é evidente. Depois os norte-americanos fazem sombra e abafam culturalmente um grande vizinho falante da mesma língua como o Canadá. Entre os países referentes do inglês, em modo ocidental de produção, espaço ainda para a Austrália, Nova Zelândia e África do Sul. Entram todos no mesmo circuito editorial ocidentalizado. Ainda assim, mesmo vir destas bandas quer dizer pouco. A contista canadiana Alice Munro (2013) é uma muito recente vencedora, de um país que tardou mais de um século a entrar no clube do Nobel da Literatura. A Nova Zelândia nunca venceu e a África do Sul teve durante muitos anos o apartheid contra ela. De outros países anglófonos esperam-se surtos exóticos e episódicos, para abrir o leque, como o nigeriano Wole Soyinka (1986). Os finalistas e vencedores de prémios como o Booker serão preferenciais na feitura da lista. Bem como os do norte-americanos National Book Award e Pulitzer.
Com a Grã-Bretanha ainda agora premiada é pouco provável que nos próximos tempos a escolha recaia por aquelas bandas. Ao Canadá também chegou o Nobel recentemente pelo que Margaret Atwood, Douglas Coupland, Michael Ondaatje ou Naomi Klein não devem estar na calha. O mesmo se passa com os Estados Unidos, com Don Delillo, Cormac McCarthy, Thomas Pynchon, Philiph Roth na linha da frente. Da Austrália, para onde o galardão foi uma vez, com a vitória de Patrick White, em 1973, Peter Carey, Thomas Keneally e David Malouf são possibilidades.
O peso cultural da França abafa o das suas antigas colónias, onde a língua francesa coexiste muitas vezes com outras línguas fortes ou até dominantes como o árabe. A África subsaariana, francófona, está demasiado afastada do mercado ocidental de edição e destes circuitos. Um Nobel falante de francês tende a vir da antiga metrópole. A lista dos galardoados com o Gouncourt, Renaudot e com o Fémina podem ajudar a antecipar escolhas, se bem que Claude Simon nunca tenha vencido nenhum desses prémios. Aqui seria de alinhar com Saramago: com dois vencedores vivos talvez seja de adiar.
Abertura para escritores como o libanês Amin Maalouf, o argelino Boualen Sansal, o marroquino Tahar Ben Jeloun, ou para Adonis, poeta sírio de língua árabe a viver em França, e há muito tempo favorito.
Tanto Espanha como as antigas colónias castelhanófonas têm massa específica própria. Um mercado editorial e escritores de grande projecção com entrada nas feiras e circuitos mundiais. Olhar para os laureados do Cervantes, do Príncipe(sa) das Astúrias e do Rainha Sofia ajuda a compor a lista. E os dois últimos estão até abertos a gente de outras línguas.
Há outras duas línguas, pesos pesados culturais, mas sem que tivessem tido por trás uma dimensão colonial duradoura que as exportasse. O alemão é partilhada por alemães, austríacos e suíços e uma ou outra comunidade fora de portas. O italiano remete-se quase apenas ao seu próprio espaço interno. No caso da língua alemã olhe-se primeiro para o prémio Buchner (Böll, Grass e Elfried Jelinek receberam-no) e para o Goethe, não exclusivamente literário. No do italiano para os Strega e Villaregio, mas apenas para efeitos de fazer esta lista, pois nunca nenhum dos seus premiados venceu o Nobel, mesmo que muitos, como Calvino ou Pavese, fossem nobelizáveis. Claudio Magris é um candidato recorrente.
No português, que demorou quase 100 anos a ter o seu primeiro Nobel da Literatura, a coisa é mais evidente (para mim) no que toca aos escritores de Portugal. Lobo Antunes está na vanguarda, mas então e Nuno Júdice ou mesmo Agustina? E no Brasil não faltam opções, talvez com Rubem Fonseca à cabeça. E depois de Dylan, embora se saiba que foi uma flor, para mostrar radicalismo, não seria de desdenhar Chico Buarque. Para abrir o leque a outras nacionalidades, atenção ao Camões, aos prémios da Associação Portuguesa de Escritores e ao desdobrado Jabuti. E o angolano José Eduardo Agualusa nunca venceu nenhum desses prémios, mas parece ter o perfil internacional adequado.
A minha amiga é negra
Ferreira Fernandes, Diário de Notícias
Saramago
Mário Cláudio, Diário de Notícias
Vi o poeta a usar o multibanco numa estação do metro. Confirmaria se já tinham feito a transferência?
(foto: hollywoodreporter.com)
Então nos últimos anos é que ninguém viu mesmo o que é que os oscares de Hollywood acrescentaram ao cinema. E Manoel Oliveira nem sequer é bicho daquela floresta. Mas passa pela cabeça de alguém ter o gigante em causa e nunca se terem lembrado de mover esmagadora campanha para lhe entregarem o Oscar de Carreira - o prémio das más consciências do mundo dos filmes?
Diz a má língua curitibana que Trevisan não se flagra na rua, sempre fechado em casa. Há décadas, recusando contactar o mundo,
Brasileiro de origem polaca, nascido em 1925, licenciado em Direito, Dalton Trevisan faz contos curtos, despojados. Procura, lembrou Fernando Assis Pacheco, no prefácio ao Cemitério de Elefantes*, a concisão do Haikai, poemas japoneses de três versos.
Anacoreta, o óbvio Vampiro de Curitiba, título de um dos seus livros mais conhecidos, anda mais do que escassamente publicado em Portugal, como aliás a maioria dos escritores brasileiros que interessam.
É literatura para quem gosta de literatura. Silenciosa, exacta, rigorosa. Páginas brevíssimas, intensamente preenchidas. Crueldade, vidas rarefeitas, ternura destruída.
Há anos que receava que o Camões passasse ao seu lado, que o deixasse ir sem dar por ele. Os portugueses nem sabem o que ali está.
* É o único livro do autor publicado em Portugal. Neste momento nem sequer está disponivel no catálogo da Relógio de Água. O resto que se vai apanhando é em edições brasileiras.
Aqui há uns anos, durante um curso de segurança e defesa para jornalistas, no Instituto de Defesa Nacional, falei um bocado sobre política de língua portuguesa com um antigo responsável governamental socialista.
Não havia ali uma ideia sobre o assunto, tirando a vaga intenção de construir uns sites e assim.
Há muito que a Espanha percebeu a importância do tema. A França também e até mesmo a Alemanha, cujo idioma só se fala na Europa, tem uma atenção ao Goethe Institut sem paralelo em Portugal ou no Brasil. Affonso Romano de Sant'Anna, recentemente, em depoimento ao Jornal de Letras, declarava que, apesar dos 200 milhões de falantes, o português é um dialecto.
Nos últimos anos, numa opção pessoal que tem mais de emocional que de racional, milhares de portugueses têm aprofundado e certificado o seu conhecimento de espanhol, idioma quase gémeo, cuja leitura e compreensão oral se tornam quase imediatas com escasso convívio. Não são as ligeiras diferenças sintáticas e os falsos amigos que justificam a dimensão do investimento. Nos níveis iniciais, então, vale a pena comparar os ritmos de entendimento de um português e do falante de outro idioma, a mais que justificarem um regime de ensino diferenciado e com menos etapas.
No que toca a prémios, a entrega do Cervantes é aguardada com expectativa pelo mundo intelectual. A percepção do Camões - e da sua evidente utilidade - é tão reduzida que na comunicação social mainstream em português chega a ter mais impacto a entrega do PT Literatura. E o próprio nome da coisa não é consensual entre as entidades portuguesas e brasileiras que o financiam. No portal do Ministério da Cultura brasileiro chega mesmo a chamar-se-lhe mesmo Prémio Luís de Camões.
Mas que fazer quando são os próprios portugueses, alguns deles com evidentes responsabilidades de Estado, que insistem em mostrar os seus dotes para falar estrangeiro em qualquer sítio onde se encontrem? Sampaio, Cavaco, Guterres, Durão Barroso, Sócrates, Passos Coelho, chegam a sítios pejados de tradutores-intépretes e preferem expressar-se na língua dos outros ou numa língua terceira.
O caso da Guiné voltou a evidenciá-lo. Nas Nações Unidas, o habitualmente patriótico Paulo Portas optou pelo inglês. Declarações em português ficaram por conta de um angolano, representante de uma potência regional que parece já ter percebido melhor que os seus irmãos mais velhos a verdadeira importância de uma política de língua.
Nota: Pelos vistos, , no seu discurso, Paulo Portas ainda fez uma perninha em crioulo. O que quer dizer que percebe a importância do uso da língua.
Surpreendente a entrega do Prémio Cervantes a Nicanor Parra.
Não pela qualidade intrínseca da obra, mas apenas por, à beira dos 100 anos, o galardão já lhe ter passado tantas vezes ao lado.
Junta-se aos também chilenos Jorge Edwards e Gonzalo Rojas, num dos mais importantes prémios literários mundiais.
Com o anúncio da entrega do Nobel da Medicina a Ralph Steinman (partilhado com Bruce Beutler e Jules Hoffman) será a segunda vez na história que o prémio é entregue a título póstumo.
O escritor sueco Erik Axel Karlfeldt era secretário da academia sueca e por esse motivo punha em causa a ideia de ser premiado.
Esperaram que morresse em 1931, para então lho atribuírem. Foi por uma vez, sem exemplo.
Até hoje.
Há dias comentou-se que a Associação Portuguesa de Escritores (APE) ainda não tinha dado pelo autor.
Afinal foi este ano, mas custou. Depois de três rondas de votação, Uma Viagem à Índia, de Gonçalo M. Tavares, venceu o Grande Prémio do Romance e Novela da APE.
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