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Ouvi hoje Cavaco falar na universidade de Verão laranja em Castelo de Vide e Maria Vieira apresentar na TVI o livro com os seus comentários numa rede social.
Não consegui distinguir um do outro.
Entrevistados pelo canal Q, dois jornalistas, desses mais divertidos, contam histórias sem sequer darem conta de que estão a confessar atropelos deontológicos.
Num caso, confessa-se o interesse de um patrocinador na cobertura de um evento desportivo-radical por determinado jornalista.
No outro caso, confessam-se responsabilidades de uma redacção na exibição ao estilo apanhados da entrevista de uma mulher - com evidentes défices culturais - que nunca foi para o ar.
O Governo Sombra começou na TSF e acabou a exibir-se na TVI24.
Agora é o Sem Moderação, do Canal Q, que ganha direito a ser ouvido na rádio.
Mais ou menos interessantes, independentemente das qualidades dos intervenientes, estes programas repetem-se em estereofonia, sem qualquer vontade de pluralismo de vozes.
Às direcções de programação e de informação nem ocorre manter o formato com outros tenores. Vão buscar os mesmos, a outros palcos, para que se possa ouvir os mesmos a dizer a mesma coisa. E alguns até se repetem em programas do género.
As regências andam pela ordem da morte.
O autor escreve que "não é essa a solução de que o país precisa". No corpo da notícia, no Expresso, mas talvez o erro venha da Lusa, até citam a frase correctamente. Mas no super-lead, o mais visível para os leitores, tratam de lhe destruir a sintaxe. Põem a frase entre aspas, mas apagam a preposição "de". Escrevem antes "não é a solução que o país precisa".
Tanto lhes faz.
Aliás, no outro dia, uma editora, um potentado do sector, mandou-me pela segunda vez uma frase a publicitar "os livros que mais gosta" . Reclamei, segunda vez. Expliquei-lhes novamente que se diz "os livros de que mais gosta".
Já nem de ouvido se chega lá, tantas são as vezes em que deglutem as preposições na televisão. Por isso, o melhor é decorar a regra: o verbo gostar e o precisar são, aqui transitivos indirectos e regem um complemento oblíquo introduzido pela preposição de.
Já se contou aí para baixo como, há uma dezena de anos, a minha interpretação do artigo 187º da Constituição foi desqualificada por um ex-editor de política de um grande diário nacional. Já se contou também como, em 2015, num canal televisivo, tantos jornalistas de política descobriram o artigo que tornava possível um partido com menos votos que outro formar Governo. Esses mesmos que não tinham lido a Constituição espantavam-se com o que só tinham visto em Borgen, uma série acerca da política dinamarquesa. E esses mesmos continuam a fazer jornalismo, com toda a presciência que a ignorância e o preconceito lhes garantem.
Dá-se de barato que, há pouco mais de um ano, o grosso dos jornalistas que fazem política não tivesse percebido o que se estava a passar. Não valem mesmo grande coisa enquanto colectivo pomposo, inculto e influente. Mas esta semana, confirmou-se que no PSD se continua também sem perceber o que lhes aconteceu por conta do referido artigo.
No recente debate parlamentar acerca da descida da TSU, vários parlamentares laranjas, entre eles o presidente do partido, voltaram a vincar a ilegitimidade do PS para governar. Zangaram-se, disseram que a maioria não consegue fazer aprovar as suas próprias medidas e fazê-las cumprir. E, hoje, Aguiar Branco, voltou ao mesmo numa entrevista ao Diário de Notícias: Que
"sem maioria parlamentar, Governo não tem legitimidade para governar."
Sim, claro, apetece dizer ao deputado e ex-ministro de um governo, o segundo e último de Passos Coelho, que caiu ao fim de pouco mais de um par de semanas na sequência da rejeição do programa pela maioria dos partidos de esquerda na Assembleia da República.
O Governo sem legitimidade de que falaram Passos Coelho e Aguiar Branco sempre tem acrescentado meses ao tempo que a PàF conseguiu para o seu segundo Governo. Mas no PSD continua-se a assobiar e a fazer de conta. António Costa pode bem a atitude. Quando os cubes perdem tempo com erros de arbitragem e com injustiças, outros entretêm-se a jogar.
Um economista explicava na televisão que o aumento do salário mínimo dos 530 euros para os 557 euros é um aumento signficativo para as empresas, pois é um aumento de cinco por cento.
Eu que sou engenheiro tenho sempre alguma dificuldade com a compreensão matemática dos economistas que falam na televisão e que dizem coisas nos jornais. É que cinco por cento de coisa quase nenhuma ainda continuam a ser coisa quase nenhuma.
Um aumento de cinco por cento do salário mínimo nacional corresponde a menos de 1 euro por dia de aumento. Há por aí muitas empresas que não sejam capazes de acondicionar nas contas mais 1 euro por dia por cada trabalhador que lá têm?
Muito se possui por essa televisão afora. É que ninguém tem.
E também ninguém põe, toda a gente coloca.
Publico, com ajustes, meia dúzia de parágrafos, de um trabalho académico meu já com dois anos (e que até pode ser lido tendo presente a figura de Donald Trump). Num esforço com outro propósito e extensão dois assuntos ganham em ser equacionados em conjunto:
«(1) o espírito e atitudes dos júris de alguns modernos concursos televisivos, de que Ídolos é modelo exemplar; e (2) as praxes estudantis. O primeiro caso, vincado pelo modo como os jurados tratam os concorrentes, veicula para os espectadores, e de modo espectacularmente agressivo e exuberante, uma alegada ideia de exigência, ética e entrega profissionais que valeria a pena estudar em termos de percepção, recepção, aceitação, recriação e reprodução no âmbito das relações hierárquicas e laborais, sociais e até de género. Quanto ao segundo desses temas, a praxe estudantil, mais do que fenómeno a pedir caracterização do ponto de vista sócio-económico ou do carácter iniciático interessa por se constituir enquanto dispositivo de violência e poder político, que constrói a sua legitimidade fáctica dentro do espaço escolar simultaneamente aberto e concentracionário e em articulação com outros agentes da corporação escolar e da Cidade.
Convém não perder de vista como as instituições de ensino têm os seus espaços de confinamento físicos próprios, as suas regras e normas específicas e até mesmo regimes disciplinares internos. Mas ao contrário de uma loja, fábrica ou banco, e por mais sólida que seja a cultura empresarial de cada uma delas, a Universidade tem outros horizontes. As instituições escolares funcionam, por exemplo, dentro de limites onde a ordem policial civil continua a não poder entrar sem autorização das autoridades corporativas investidas, um privilégio periódica e cronologicamente adquirido e perdido.
Há a escola e há o mundo do trabalho. Do mesmo modo que, para pegar em exemplos foucauldianos, existe a prisão e o mundo lá fora; ou o hospital e a realidade dos que são (ou estão ainda) saudáveis. Que existe esse degrau entre a escola e o mundo, esse contemptus mundi, o desprezo do mundo, de que se falava nos mosteiros da Idade Média, é provado não só pelas dificuldades de acesso dos policiais, mas também pelos recorrentes convites a que Universidade e Trabalho se aproximem.
Este processo tem algo de equalizador e assenta num discurso político que, nos últimos anos, tem tentado desentranhar o espírito de corpo de várias instituições estatais ou na sua órbita pública, mas que em última instância não deixa de constituir também um assalto à fortaleza. Ao permitir ou ao criar condições para que o exterior, a Sociedade Civil, penetre na corporação desordenam-na nos seus pressupostos intrínsecos e estabilizados, mas também lhe fragilizam a capacidade de intervir política e autonomamente na sua condição estadual. Este processo pode ser observado em dois andamentos. Nos últimos anos desapareceram da Universidade portuguesa os órgãos de gestão com presença paritária de docentes e estudantes – como foram os senados, assembleias de representantes, conselhos directivos e pedagógicos, depois do 25 de Abril – e criaram-se conselhos gerais já entrados pela Sociedade Civil e por personalidades que muitas vezes às universidades dizem nada.
Fora das funções de soberania, e talvez por isso situados num espectro menos visível enquanto engrenagem do aparelho estatal, a Universidade é também um foco de poder com procedimentos a que o Estado dá cobertura mesmo quando os não institui burocraticamente. Seguindo Foucault, o Estado surge mais como um de entre muitos efeitos possíveis da concertação de micropoderes e terá resultado no essencial de mudanças nas formas de governo que se engrenaram e acamaram num sentido e não noutro. Assim, em última instância, uma descentralização desta microfísica de poderes – como a que se opera dentro da universidade e é reproduzida nas estratégias discursivas dos mais variados agentes que assim tecem uma matriz nominalista, como lembra Jorge Ramos do Ó – pode bem concretizar-se noutros resultados que não a forma Estado.
Mas talvez este exercício seja mais do âmbito da chamada Ciência Política, um saber zandinguizante, de prospecção e acção, mais do que de conhecimento científico analítico-sintético; ou de uma concepção historiográfica ultrapassada – a que vê a História como mestra da vida e capaz de antecipar os futuros.»
Mario Vargas Llosa escreveu A Civilização do Espectáculo, Guy Debord A Sociedade do Espectáculo.
Mesmo aquém da problematização necessária, Gilles Lipovetsky escreveu acerca d'A Era do Vazio e d'O Império do Efémero.
Em A conspiração contra a América, Philip Roth ficcionou uns Estados Unidos governados por nazis e pelo muitíssimo popular aviador Charles Lindbergh, vencedor de Franklin Roosevelt, nas eleições presidenciais de 1940. E ficcionou as consequências para a Europa e para o Mundo das cordiais relações com Hitler do hipotético presidente.
O escritor Don DeLillo tem várias obras acerca do real e da sua contaminação pelo espectáculo, veja-se Mao II ou a peça Valparaiso. O recém-desaparecido Nobel Dario Fo expôs as entranhas do teatro dentro do teatro e da realidade.
Apesar das diferenças culturais (e também de valores) entre ambos, Berlusconi e Marcelo Rebelo de Sousa são realidades televisivas. E chegaram antes de Trump.
Ferreira Fernandes in E se Donald Trump me obriga a pagar o que aprendi com ele?
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